Monday, July 02, 2007

Nascer além fronteiras

Alguns amigos meus estão muito escandalizados com o facto de cidadãos portugueses, neste caso cidadãs, terem de dar à luz os seus filhos em Espanha. Esta opinião releva sobretudo o caso de Elvas e das parturientes que se têm de dirigir a Badajoz. Sempre me manifestei contra esta opinião, porque sempre me foi difícil comprendê-la. Para mim nascer para cá ou para lá de um traço, mais ou menos imaginário, existente numa dada região do globo é absolutamente irrelevante. O que conta é o futuro, a cultura que o cidadão em embrião vai absorver e mais, vai espalhar no ambiente que o rodeia.
Vem este comentário a propósito de uma notícia do Público do dia 1 de Julho em que se refere que no hospital de Badajoz se fazem cursos de português frequentados por algumas centenas de pessoas para darem assistência conveniente às parturientes e familiares, assim como para alargarem os serviços prestados a outras especialidades médicas que a diminuta população de Elvas merece, mas a que não tinha direito.
Regozijo-me com o facto de bebés portugueses estarem a provocar a disseminação da nossa língua, que é sem dúvida o veículo primordial para a nossa cultura, e enquanto houver língua e cultura há Nação.
Na mesma notícia refere-se que durante um ano de vigência deste regime nasceram em Badajoz 260 portugueses entre o total de 3000 crianças cujo nascimento ali teve lugar o que corresponde a 95% dos partos da região o que demonstra que os portugueses são pobres, mas não são parvos, e escolhem o melhor.

"Não tenho sentimento nenhum politico ou social. Tenho, porém, num sentido, um alto sentimento patriotico. Minha patria é a lingua portuguesa. Nada me pesaria que invadissem ou tomassem Portugal, desde que não me incommodassem pessoalmente, Mas odeio, com odio verdadeiro, com o unico odio que sinto, não quem escreve mal portuguez, não quem não sabe syntaxe, não quem escreve em orthographia simplificada, mas a pagina mal escripta, como pessoa própria, a syntaxe errada, como gente em que se bata, a orthographia sem ípsilon, como escarro directo que me enoja independentemente de quem o cuspisse.

Sim, porque a orthographia também é gente. A palavra é completa vista e ouvida. E a gala da transliteração greco-romana veste-m'a do seu vero manto régio, pelo qual é senhora e rainha."

Bernardo Soares, O livro do Dessassossego


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